O Ministério Público do Rio de Janeiro investiga transações imobiliárias feitas pelo senador Flávio Bolsonaro (Republicanos-RJ) que lhe garantiram lucro de pelo menos R$ 5 milhões em uma década. São pelo menos 20 imóveis comprados por R$ 11,9 milhões entre 2007 e 2017, quando ele era deputado estadual.
Em depoimento aos promotores, o político admitiu ter usado dinheiro vivo em pelo menos duas transações. O fato, segundo os investigadores, é indício de crime de lavagem de dinheiro.
O lucro milionário investigado pelo MP foi somado pela CNN em documentos da investigação sobre a prática das “rachadinhas” no gabinete do filho do presidente Jair Bolsonaro na Assembleia Legislativa do Rio. Sempre que questionado sobre o assunto, o parlamentar nega irregularidades e afirma que seu patrimônio é declarado e compatível com sua renda.
A CNN teve acesso ao áudio de um trecho do depoimento prestado por Flávio Bolsonaro ao MP no dia 7 de julho. O senador admitiu ter usado, em 2014, R$ 30 mil em espécie para o pagamento de móveis, comprados de um empresário que lhe vendera um apartamento na Barra da Tijuca, por R$ 2,5 milhões. Perguntado o porquê de ter pago a quantia em dinheiro vivo, Flávio Bolsonaro afirmou que “tinha uma coisinha guardada em casa”, em referência aos R$ 30 mil, mas não explicou a origem do dinheiro.
Ainda de acordo com o senador, a verba serviu para pagar “coisas banais”, como “cortinas e lustres” deixados pelo dono anterior do imóvel. O senador afirmou que paga o apartamento “até hoje”, por ter parcelado R$ 300 mil por meio de um financiamento e que, atualmente, o imóvel está alugado. A maior parte, R$ 2,2 milhões, foi paga com recursos próprios por meio de transferências bancárias.
Para Roberto Bliger, advogado e diretor jurídico da Associação Brasileira das Administradoras de Imóveis, o uso de dinheiro vivo para pagar despesas imobiliárias “não é prática comum no mercado”. “São transações com altos valores, e a preocupação, nesses casos, é com a segurança. Quase todas as transferências são bancárias, e não há problema, pois isso fica registrado em cartório”, explicou o especialista.
Ao MP, Flávio Bolsonaro também admitiu ter usado R$ 86,7 mil como parte do pagamento por 12 salas comerciais em um condomínio na Barra da Tijuca. A transação aconteceu em 2008, e o restante do valor o político teria financiado. Quase dois anos depois, em setembro de 2010, o senador registou a compra das salas em um cartório da Barra da Tijuca. Após 43 dias, as vendeu para uma empresa estrangeira. Com as vendas, Flávio teria lucrado R$ 318 mil, segundo o MP.
O apartamento e as salas comerciais na Barra da Tijuca fazem parte de pelo menos cinco “núcleos” de transações imobiliárias investigadas pelo MP. Os lucros, calculados pela CNN, somam pouco mais de R$ 5 milhões. Há indícios, segundo os promotores, de lavagem de dinheiro em imóveis comprados em Copacabana, Botafogo e Laranjeiras, todos bairros da Zona Sul do Rio.
Em cada um desses casos, o MP questiona os altos e rápidos lucros obtidos por Flávio com a compra e venda de imóveis. A compra e venda de um apartamento em Copacabana, por exemplo, rendeu lucro 292% ao senador em apenas 15 meses, enquanto no mesmo período, a valorização imobiliária não passou de 11%.
“Desconheço qualquer região do Rio de Janeiro que tenha valorizado tanto a ponto de permitir lucro de quase 300% entre compra e a venda do imóvel. Ainda mais neste caso, com tão pouco tempo. No Rio, quem comprou em 2008 e vendeu em 2014, por exemplo, conseguiu dobrar o valor. Mas em 15 meses é impossível, não há possibilidade de lucro tão alto em curto prazo”, argumenta o especialista Roberto Bigliger.
Ao pedir a prisão de Fabrício Queiroz, ex-assessor de Flávio Bolsonaro e apontado como operador da organização criminosa que atuaria no gabinete do ex-deputado, o MP do Rio afirma que senador seria o beneficiário dos valores subtraídos dos salários de assessores do seu gabinete na Asssembleia Legislativa do Rio.
Em outro documento do processo, do final de 2019, os investigadores afirmam que a compra de imóveis feitas pelo senador teve “o claro objetivo de lavar parte dos recursos em espécie obtidos ilicitamente através do esquema das ‘rachadinhas’ de servidores da ALERJ”.
CNN BRASIL