Artigo: Caicó – do voto de cabresto a negação da diversidade

A eleição de 2024 em Caicó inaugura um ciclo de falsas expectativas na política local ao mesmo tempo em que antigas polarizações partidárias começam a ceder lugar a explícitos acordões, ambiente mais do que adequado para construir cenários incertos comandados por atores políticos que almejam o topo da liderança e o controle dos currais eleitorais, indiferentes as demandas da população. Sob esta lógica, somente duas coisas continuarão as mesmas – o conservadorismo tradicionalista dos agentes políticos que estão na disputa pelo poder, e a cegueira de um eleitorado resistente a quebrar as correntes da mesmice, do atraso e das ilusões daquilo que pensamos ser.

 Diante o enfraquecimento eleitoral das velhas figuras que por décadas ditaram as regras do jogo político, com outros nomes fora do páreo e alguns já falecidos, uma nova safra de postulantes a ocuparem estes espaços faz ferver o caldeirão das disputas, movimentações estas que servem para mostrar quem manda, quem tem chances de continuar e quem sucumbirá ao fosso do esquecimento pelo veredito final das urnas.

 O tão sonhado cenário de mudanças que parte dos caicoenses deseja, confronta-se com os escombros deixados como herança pelas duas forças políticas hegemônicas que há 50 anos se alternam no poder por aqui. Infelizmente, os dejetos dessa velha e carcomida estrutura embrenharam-se como lama vulcânica no comportamento político dos seus herdeiros que dão passos largos para assumir o papel de protagonistas que por décadas foi de responsabilidade dos antigos coronéis. Se o passo vai ser maior do que a perna, só os caminhos a serem percorridos dirão!

 No meio dessas disputas, o vivaldismo, célula do dinartismo udenista/arenista, começa a referendar seus novos representantes através do uso político da força mobilizadora da máquina pública sob a chancela turbinada do atual prefeito da cidade. Na contramão do processo, seus tradicionais adversários residentes no antigo MDB de Aluísio Alves e Manoel Torres assistem ao desmoronar de seus legados, consequência das movimentações desastrosas e personalistas de seus líderes e liderados que nos últimos anos esvaziaram a legenda dos bacuraus deixando-a sem capacidade de disputa dentro das quatro linhas da polarização das bandeiras Verde e Vermelha que, no passado, sustentavam o velho absolutismo político de seus antigos mandachuvas.

 Paralela a estes desmontes partidários, uma esquerda, hora sem rumos, arreou sua bandeira e parece ter desistido de conquistar seu lugar como alternativa a essa situação que condenou por décadas, em algumas eleições, até apresentou candidaturas competitivas, mas, com o tempo, definhou pelo sectarismo de seus dirigentes e pela entrega de suas bases eleitorais aos interesses daqueles que tanto condenava. Cedeu, por fim, ao pensamento único pró-direita.

 Hoje, os dois principais partidos dessa frente de esquerdas caicoenses nada mais são que correias de transmissão de projetos políticos que em nada representam a agenda que por anos defenderam; como último ato, renunciaram ao capital eleitoral que lhes deu legitimidade em momentos de defesa da pluralidade e da diversidade no debate político local para servirem de mera sucursal de um modelo de gestão municipal pão e circo que nos governa sem projeto de cidade e que se prepara, estrategicamente, para governar por mais 40 anos, desta feita, sob o referendo de alianças onde a mistura ideológica nada convincente, com uma visão confusa de cidade faz amargo e indigesto os resultados.

 A depender das conveniências do momento, que seduz e estimula crenças em prol de uma mentalidade repetidamente propagandeada no nosso meio social de que tudo está a mil maravilhas, o atual cenário eleitoral parece apontar para uma unanimidade a favor de uma reeleição que colocará o futuro da política caicoense no cadafalso da história.

 Consequentemente, a mendicância eleitoral, a mercantilização do voto, a pobreza estrutural e as mentiras tantas vezes repetidas que nos transformaram num “Pedacinho do Céu”, só confirmam que, por aqui, o voto ainda é de cabresto, proclamando a unanimidade como ato inconsequente da negação da diversidade de pensamentos, ideias, oposições e opiniões.

Antônio Neves

Professor e Historiador.

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