Votação no negacionista Albert Dickson para parlamentar do ano em 2021 foi uma mistura de descolamento da realidade e auto-defesa de parte da imprensa local

Os jornalistas Rafael Duarte e Bruno Barreto já escreveram sobre como foi desrespeitosa a concessão do título de parlamentar do ano de 2021 na Assembleia Legislativa do RN para o deputado estadual negacionistas Albert Dickson (leia aqui e aqui). Dickson atingiu 29 votos e soprepujou Tomba com 11, conforme votação de um comitê composto por jornalistas que cobrem os trabalhos da casa.

Cabe apenas lembrar que a postura não é incoerente com o que parte da imprensa fez durante a pandemia de covid-19 no Rio Grande do Norte. Enxergar em um parlamentar que se notabilizou nacionalmente por ser um espalhador de notícias falsas contra a covid um trabalho exemplar é sinônimo da demonstração de total descolamento da realidade e/ou a defesa sobre o que os mesmos jornalistas fizeram e defenderam no verão passado.

Assim como o médico político, parte da imprensa local chafurdou na propagação de falsos tratamentos contra covid, prognósticos alicerçados em dados inexistentes e não cansou de publicar estudos mandrakes. Vale citar alguns exemplos concretos:

  1. “Ivermectina: Após 44 estudos, foi considerado um medicamento eficaz como tratamento profilático e precoce”. Basta colocar a frase no google para saber que os tais estudos, apesar de alardeados na esfera pública local, não existem. Eles saíram de plataformas anônimas chamadas de c19study, ivimeta.com. Há diversos alertas de cientistas sobre os perigos de levar em consideração tais sites. Após apuração, a imprensa nacional publicou que um deles é mantido pela principal fabricante da ivermectina no Brasil;
  2. “Ivermectina salva vidas em Natal”. Esta foi também uma mentira publicada em diversos veículos de comunicação da capital. Chegou-se a afirmar que 7 mil pessoas tinham sobrevivido em decorrência do mata carrapato. Ora, trata-se de mais uma invenção. Natal sempre esteve em índices bem superiores à média local e nacional de casos e óbitos por covid. As agências de checagem alertaram para a base de sustentação em fake news de Natal como case de sucesso;
  3. “Ivermectina pode reduzir o risco de morte em até 75%, conforme estudo da universidade de oxford”. Aqui no RN a manchete citada ainda vinha recheada pelo apoio de médicos locais. Mais uma mentira feita por políticos e médicos da capital com a chancela de parte da imprensa potiguar. A reunião de anúncio do estudo promovida pela Associação Médica do RN virou chacota nacional com a publicação de uma reportagem na revista época.

Se estivesse participando de uma prova da negação da realidade, o parlamentar do ano no RN em 2021, conforme o tal comitê de imprensa que cobre a Assembleia, teria gabaritado. Mas Albert Dickson foi além. Não bastou ter sido um dos principais propagadores da falsa solução de proteção e cura contra covid no RN. E conforme os estudos locais, nacionais e internacionais, quem acreditou em tais saídas se colocou mais em risco do que quem tinha a exata dimensão do problema, terminando em UTIs e em caixões. Dickson defendeu flutamida, proxalutamida, alegou que enxaguante bucal protegia contra a variante indiana etc. A sua atuação lhe rendeu a retirada de diversos vídeos do youtube por ferir as regras da plataforma alicerçadas nas recomendações da Organização Mundial de Saúde.

Enquanto o mundo construía o consenso de que Cloroquina e Ivermectina não tinham efeito algum contra covid. No caso da Cloroquina, chegava a aumentar o letalidade dos usuários por arritmias cardíacas. E ambos incrementavam o número de óbitos pela falsa sensação de segurança, que fazia baixar a guarda contra a doença; Dickson encontrava toda a base na imprensa para espalhar mentiras sobre o novo coronavírus. O reconhecimento do trabalho de Dickson foi apenas o coroamento do que parte da imprensa local apoiou até aqui.

Deixo aqui como sugestão de epígrafe para o prêmio uma fala no plenário da casa do parlamentar do ano durante 2021 após a aprovação das primeiras vacinas contra covid-19:

“Em uso profilático, a ivermectina tem 90% de resolutividade. Hoje, a Coronavac tem 50% após a segunda dose. Eu não sou contra vacinas, mas estou trazendo os resultados. A de Oxford chega a 70%. Na África do Sul, após a mutação [do coronavírus], já se proibiu a de Oxford. Com a mutação, a vacinação não está garantindo a resolutividade”.

PS. Apesar de defender que a ivermectina tem muito maior eficácia do que as vacinas, conforme sua fala acima, assim que chegou sua vez o médico correu para o posto de saúde e tomou o imunizante.

Fonte: Daniel Menezes – O Potiguar

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