Reinaldo Azevedo – Será mesmo que há forças no Brasil que pensam em governar sem o Congresso ou que imaginam um modo de, por intermédio do seu aparelhamento, dominar toda a República, incluindo os tribunais, as agências e o Banco Central? Que eu me lembre, foi Jair Bolsonaro quem anunciou essa pretensão na Avenida Paulista, em cima de um palanque, num ato contra o STF, no dia 29 de junho, na presença de governadores. O governo que há não parece empenhado nesse intento. Para que não reste dúvidas, lembro a fala do ex-presidente:
“Se vocês me derem, por ocasião das eleições do ano que vem, 50% da Câmara e 50% do Senado, eu mudo o destino do Brasil. Tarcísio, quando eu falo isso, tem outros 50% para o Republicanos, para o PSD, pro PP, MDB, União Brasil… Se vocês me derem isso, não interessa onde eu esteja, aqui ou no além, quem assumir a liderança vai mandar mais do que o presidente da República. Com essa maioria, nós elegeremos o nosso presidente da Câmara, o nosso presidente do Senado, o nosso presidente do Congresso Nacional, a maioria das comissões de peso no Senado e na Câmara. Lá no Senado, nas sabatinas, nós decidiremos quem prosseguirá nessa missão ou não. Nós indicaremos os integrantes das agências, nós escolheremos, e não o presidente [da República], o presidente do Banco Central e todo o seu secretariado. Nós seremos os responsáveis pelo destino do Brasil. Então o recado: não quero isso para perseguir quem quer que seja; não quero isso para revanchismo; eu quero isso pelo futuro do meu Brasil. E digo mais: nem eu preciso ser presidente. O Valdemar [Costa Neto] me mantendo como presidente de honra do Partido Liberal, nós faremos isso por vocês”.
Não é crime querer ganhar eleições. Anunciar um poder paralelo numa manifestação contra o Supremo, que é o tribunal que o processa por tentativa de golpe de Estado, bem, nesse caso, isso parece, quando menos, indagar aos idiotas da objetividade se ele estava só a expressar um desejo de vitória nas urnas ou, na verdade, reincidia na retomada, pela via eleitoral, de um plano que seria executado por meio da violência e que foi frustrado. De resto, não era nem mesmo um comício eleitoral. Há mais: em entrevista à Folha, o senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ) assegurou que, vencendo um aliado de seu pai, há de se conceder um indulto aos golpistas. Se o STF disser, nessa hipótese, que é, e é, inconstitucional, a medida será imposta à força. Quem quer fechar o quê?
CONVERSA MOLE
Que conversa mole é essa de que os protestos nas redes contra lideranças políticas buscam desmoralizar o Poder Legislativo e afrontam a democracia? Quem patrocinava ações de rua contra o Congresso e o Supremo — a primeira se deu em 26 de maio de 2019 — era Jair Bolsonaro.
O Poder Legislativo fez escolhas, e há aqueles que não se conformam com elas. Obviamente não endosso — até porque defendo regulação das redes, como é público — que se cometam crimes sob qualquer pretexto. Mas o protesto e a ironia são parte do jogo, não é? Preciso lembrar aqui a sucessão de eventos que levou à aprovação daquele PDL inconstitucional?.