Transparência Brasil obteve, via Lei de Acesso à Informação, dados de 2020 e 2021. Obras tinham apenas contrato provisório, e especialistas veem uso político na destinação dos recursos e possível violação da Lei de Responsabilidade Fiscal..
A maior parte do valor empenhado pelo Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE) para obras de creches e escolas, via orçamento secreto, foi destinada a construções e benfeitorias que ainda não foram aprovadas pelo órgão.
Os dados foram obtidos pela Transparência Brasil, uma entidade sem fins lucrativos, via Lei de Acesso à Informação, e consideram os anos de 2020 e 2021.
Orçamento secreto é o nome dado às chamadas emendas de relator. São verbas da União distribuídas pelo relator do Orçamento para deputados e senadores. Os critérios de repasse são considerados pouco transparentes, assim como a fiscalização da aplicação dos recursos.
O levantamento mostra que foram empenhados, ou seja, reservados no orçamento, R$ 789,8 milhões em emendas de relator para 4,7 mil obras em creches e pré-escolas em todo país. A maioria dos recursos, R$ 423 milhões (53%), foi reservada a 1.939 obras que ainda não foram aprovadas pelo FNDE.
Segundo o órgão, as obras têm apenas um “Termo de Compromisso com Cláusula Suspensiva”, uma espécie de contrato provisório que garante o empenho do recurso.
O contrato só se torna definitivo quando o estado ou município encaminha ao FNDE os documentos que comprovam a propriedade dos imóveis, além de plantas e medições do terreno.
Os gestores locais ficam impedidos de iniciar a licitação para executar os recursos até que o fundo aprove a documentação.
“Em se tratando de uma área tão estratégica quanto a educação, e de um volume de recursos públicos tão significativo, a lacuna na possibilidade de controle é gravíssima. Torna impossível verificar se, quando e quais obras serão ou não afinal aprovadas e estarão aptas a iniciar”, afirma em nota a Transparência Brasil.
Enquanto esses valores milionários são reservados a obras inexistentes, há 2,5 mil obras atrasadas em unidades educacionais espalhadas pelo país, que também dependem de recursos do FNDE. Segundo levantamento da Transparência Brasil, 72% dessas obras estão completamente paralisadas, ou seja, se deteriorando.
Marina Atoji, gerente de projetos da entidade, aponta uma potencial violação da Lei de Responsabilidade Fiscal: “O artigo 45 da LRF determina que a destinação de recursos para novas obras só deve ser feita se já houver garantido recurso para as obras que já estão em andamento. Então, a destinação de emendas de relator para novas obras, como por exemplo a construção de unidades educacionais, posa um risco de violação dessa lei.”
Ela também destaca o que classifica de “caráter político-eleitoreiro” desse gasto. “Vai ser a obra que vai render um maior dividendo político, partidário e eleitoral para o autor da emenda. Você tem essas obras paralisadas ou atrasadas deixadas pra trás, para que fique mais bonito fazer emendas ou destinar verbas para novas construções.”
G1*